> Chamo-me André e tenho 6 anos.
>
> Neste Natal eu queria um presente muito especial. Eu queria que em
> todo o mundo houvesse Paz e Amor, mas sei bem que isso é impossível de
> realizar...
> …pelo menos aqui no meu prédio.
>
> Sempre que a vizinha do 5.º Dto. faz amor, não há paz na vizinhança.
> Principalmente quando o marido sai em viagem de negócios.
> Nesses dias, se calhar a televisão dela fica avariada, porque está
> sempre a passar aquele
> anúncio do shampoo Herbal Essences. "Ò ... sim, sim ... siiiim".
>
> Bem!
> Como a Paz e o Amor estão riscados da lista, vou ter que optar pelos
> bens materiais, coisa que eu não queria nada ...
>
> Para começar, eu queria que este ano a minha prenda de Natal fosse um
> brinquedo muito divertido que vi na televisão.
> Não, não é nenhuma daquelas mariquices dos Action Man, Homem Aranha ou
> tartarugas Ninja.
> O que eu queria mesmo era uma coisa que vi ontem no Telejornal!
>
> Pai Natal, eu queria muito que me trouxesses um brinquedo que se chama
> RPG 7, que é um lança-granadas igualzinho aqueles que os terroristas
> usam para rebentar com os americanos no Iraque.
>
> Mas preciso muito que me entregues o brinquedo já este fim-de-semana
> para eu fazer uma surpresa aos meus coleguinhas lá da escola.
> Eles vão estar todos numa festa de Natal, em casa Henrique, que é
> filho de um grande empresário
> têxtil, que não paga salários há 3 meses, contrata capangas para dar
> porrada nos sindicalistas e tem uma amante no prédio onde mora a minha
> avó.
>
> Todos os coleguinhas da minha sala foram convidados para a festa menos
> eu, porque o Henrique diz que o meu pai é teso e as minhas roupas
> parece que foram compradas na Feira de Carcavelos, em segunda mão, aos
> ciganos.
>
> Eu sei que desfazer os coleguinhas da 1.ª classe com tiros de bazuca
> não é uma coisa muito bonita. Mas no ano passado fartei-me de fazer
> boas acções e a prenda que me trouxeste foi a porcaria de um carro
> telecomandado comprado aos marroquinos, que se avariou logo no
> primeiro dia.
>
> Bem, pelo menos sempre deu para aproveitar as pilhas para o vibrador
> da minha mãe!
>
> E por falar na minha mãe, neste Natal queria que ela tivesse uma
> prenda muito bonita ... pelo que percebi, ela precisa muito de uma
> padaria mesmo
> aqui à porta do prédio, porque há mais de um mês que não vê o padeiro
> … pelo menos foi isso que ela contou no outro dia, quando estava ao
> telemóvel
> com um amiguinho que se chama Robertão.
>
> Realmente, a minha mãezinha deve ter muita fome, porque depois começou
> a dizer ao amiguinho que lhe vai morder o cacete e, a seguir, vai
> pô-lo a
> aquecer na fornalha dela até ele ficar grande ... o que acho
> esquisito, porque eu aprendi na escola que, sem fermento o cacete não
> cresce!
>
> Quanto ao meu pai, a prenda dele é uma daquelas máquinas que vendem
> tabaco nos cafés ... é para ter cá em casa porque sempre que o meu pai
> sai à noite para comprar tabaco só volta no dia seguinte.
>
> Quando chega a casa diz que correu os cafés todos da zona e só
> conseguiu encontrar a marca de cigarros que ele fuma em Bragança, na
> boite A Bruxa.
>
> É engraçado! A minha mãe diz que ele vai a Bragança à procura da
> brasileira, mas que eu saiba isso não é uma marca de cigarros ... é
> uma marca de café!
> Depois a minha mãe começa a falar em marcas de baton na camisa e aí é
> que eu fico sem perceber nada!
>
> Olha, mas se não arranjares a máquina, tenta ao menos passar pelo
> Ribatejo e trazer um par de cornos.
> Pelo menos a minha mãe está sempre a dizer que era disso que ele precisava.
>
> Para o meu irmão queria uma coisa mais simples. Basta trazeres umas
> roupinhas modernas, dessas que os adolescentes usam. Pelo que percebi,
> ele
> não deve gostar nada das roupas que os meus pais lhe compram, porque
> todas as noites, quando sai com os amigos, leva os vestidos da minha
> mãe.
>
> Diz o meu tio Zé que até dá pena ver o meu mano ali na zona do Parque
> Eduardo VII, com as perninhas ao frio e com aquelas botas altas tão
> desconfortáveis. Deve-lhe doer muito os pés porque leva a noite
> inteira a pedir boleia aos carros que passam ...
>
> E pronto, acho que já está tudo! Agora vê lá, não te esqueças de nada,
> se não sou bem capaz de fazer um telefonema anónimo a uma certa
> jornalista do Expresso a contar um episódio engraçado que me aconteceu
> no ano passado,
> quando te fui visitar ali a um Shopping, no Saldanha.
>
> Ela vai gostar muito de saber que, quando eu estava no teu colo,
> aproveitaste para me apalpar o rabo e convidares-me para brincar aos
> trenós
> e aos comboinhos na tua casa, em Elvas!
>
> É claro que ambos sabemos que isso não foi verdade! O que aconteceu
> realmente foi que te apanhei a fumar droga e a veres revistas
> pornográficas na casa de banho, mas sabes como é a memória das
> crianças ... vemos muitos desenhos animados e, por isso, estamos
> sempre a confundir as coisas. E convenhamos que o nome "Bibi da
> Lapónia" te assenta como uma luva.
>
> Por isso, ou me trazes as prendas todas que te pedi ou é bom que
> comeces a procurar um bom advogado. E não te esqueças de comprar
> muitas embalagens de gel de banho. É que ali na prisão de Custóias
> dizem que é perigoso tomar duche com sabonete ... quando ele cai ao
> chão se te baixares para o apanhar corres o risco de ... ui ...
>
> Pelo menos é garantido que vais ter um Bom Natal e um Feliz Ânus Novo!
>
> Beijinhos,
> Andrézinho